A Juíza e a sua história – Dra. Careen Fernandes – TJAM

Mulher de fibra e de fé, a Magistrada contornou inúmeros obstáculos ao longo da carreira e considera que esses episódios serviram para fortalecê-la.
Por Danusa Andrade.
Publicado em 08/01/2024 às 19:11. Atualizado há 4 meses.

LogoA Juíza de Direito Dra. Careen Fernandes

Nesta semana, a ANAMAGES lança luz à trajetória profissional da Juíza de Direito Dra. Careen Fernandes, titular da 7ª Vara Criminal de Manaus e Coordenadora da Vara de Inquéritos Policiais da mesma comarca.

Natural de Manaus, a Magistrada assumiu o concurso no Tribunal de Justiça do Amazonas em maio de 1998 e exerceu o ofício como titular da 1ª Vara da comarca de Coari (1998/2007) e na Vara Única da comarca de Presidente Figueiredo (2007/2010) até assumir a sua atual titularidade.

Nesses 25 anos de dedicação à judicatura, a Juíza respondeu ainda por Santo Antônio do Içá, Tonantins, Amaturá, Tefé, Codajás, Santa Isabel do Rio Negro,
Urucurituba e Caapiranga, tendo atuado em diversas áreas na capital, com ricas experiências na Justiça Eleitoral, sendo a última delas entre 2016 e 2017, pela 70ª Zona Eleitoral de Manaus.

Mulher de fibra e de fé, a Magistrada contornou inúmeros obstáculos ao longo da carreira e considera que esses episódios serviram para fortalecê-la. Confira a entrevista que ela concedeu para a ANAMAGES.

ANAMAGES: Em que momento de sua vida a senhora passou a considerar a carreira da Magistratura?

Dra. Careen: Durante o curso de Direito, quase todos os meus estágios foram na área da advocacia. Ao me formar, ainda sem intenção de prestar concurso, eu montei um escritório com dois colegas de faculdade e trabalhamos juntos por volta de três anos.

Paralelamente a essa experiência, eu realizava um trabalho voluntário a convite do pároco da igreja que eu e o meu pai frequentávamos. Certa vez, por sugestão deste pároco, que é professor da Universidade do Amazonas e na época assessorava um Desembargador no Tribunal, eu busquei estágio voluntário junto ao Desembargador Ataliba David Antonio e ao final dessa experiência eu recebi o convite para efetivamente assumir como assessora. Foi a partir desse momento que eu passei a considerar a carreira.

ANAMAGES: Como se deu a preparação para o concurso da Magistratura?

Dra. Careen: A partir do momento em que eu decidi que queria trilhar esse caminho, eu fiz uma pausa no trabalho durante algum tempo, saí do escritório, fiz alguns cursos e me dediquei a estudar. Fiz um curso preparatório direcionado ao concurso do Ministério Público porque na época não existia em meu estado um curso voltado à preparação da Magistratura, e eu conquistei a aprovação a partir dessas escolhas.

ANAMAGES: Como mulher, comente sobre as abdicações e os desafios do exercício da judicatura.

Dra. Careen: Como mulher, nós enfrentamos dificuldades além das inerentes à função. É mais complicado para a mulher se impor, se fazer cumprir. Certa vez, um prefeito disse que não iria cumprir ordem dada por mulher. Enfim, essas mentalidades que a gente tem que enfrentar e a gente tem que fazer valer as nossas decisões, que são tomadas com base na lei, e temos que ir até as últimas consequências para que a população, os jurisdicionados e até as outras autoridades entendam que a nossa função não é uma questão de gênero.

Sem dúvidas que no Amazonas, ao longo desses 25 anos, muitas situações foram enfrentadas por conta da condição de ser mulher, mas eu creio que isso só nos fortalece. A gente também encontra outras dificuldades. Manter um casamento, ter filhos é mais complicado para a mulher magistrada, especialmente na fase em que ela tem que se deslocar para o interior e eu passei por essas dificuldades. Mas eu acredito que nós, mulheres, temos uma fibra muito grande e na medida que nós amamos a profissão, nos sentimos realizadas e isso nos dá força para enfrentar todas as dificuldades que surgem, inclusive as familiares.

ANAMAGES: Relate as peculiaridades da carreira em Manaus e como a senhora transpõe os percalços que vão surgindo.

Dra. Careen: Um estado territorialmente imenso, quase continental, que não é tão populoso, mas que tem uma população bem espalhada faz com que assumamos muitas dificuldades com relação à logística. Ficamos muito isolados nas nossas comarcas, grande parte delas têm difícil acesso, a maioria delas com acesso apenas por barco, algumas com acesso por avião e bem poucas com acesso terrestre.

Eu creio que esse isolamento no Amazonas seja a maior dificuldade a ser enfrentada pelos Juízes, especialmente pelas Juízas em relação ao distanciamento familiar, à educação de filhos.

Também ficamos bastante isolados do resto do país. Saímos do Amazonas apenas de avião porque por estrada não temos acesso e a viagem de barco para o resto do país se torna inviável. Na última década houve um aumento exponencial da criminalidade e isso impacta diretamente nos volumes de ações. Ainda sim, eu continuo com a missão que me foi dada com muita dedicação e amor.

ANAMAGES: A carreira da Magistratura é marcada por muitas atribuições- altos níveis de produtividade, atendimento a partes, treinamento de equipe de gabinete, participação em mutirões, períodos eleitorais, entre outros. Esse quadro de sobrecarga contribui para a diminuição da qualidade da saúde dos Juízes. Como a senhora lida com essa realidade e ainda consegue entregar uma boa prestação jurisdicional?

Dra. Careen:O Poder Judiciário estadual não tem muitos recursos como o federal, então nós lidamos com uma cobrança e uma demanda muito grandes, com poucos meios de atendê-los. Hoje poucos jovens se interessam pela carreira justamente por isso. Existem outras carreiras que oferecem o mesmo nível salarial com menos cobrança e vejo muitos colegas abrindo mão da carreira para atuar em outras funções, outros com problemas de saúde, problemas emocionais.

Ainda não temos apoio psicológico, pisiquiátrico e isso tem causado danos. É um caminho necessário dar um apoio maior aos magistrados para garantir a saúde, a longevidade, a atuação mais eficaz e produtiva.

As vezes eu me sinto cansada, desmotivada, sobrecarregada e eu procuro por meios próprios lidar com isso. Busco o apoio familiar, apoio psicológico e uma coisa que me fortalece muito é a fé, um apoio de natureza religiosa, que me dá forças no exercício da Magistratura.

Apesar de todo o esforço, algumas ações acabam demorando mais tempo, por motivos bem variados, e o principal deles é que há um volume muito maior do que a gente é capaz de realizar todos os dias, mas isso não tem sido um obstáculo impeditivo de prosseguir dando o máximo da minha capacidade e dedicação para obter o melhor resultado dentro do menor prazo possível.